sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Repressões de pai

Desde que me conheço por gente, lembro da insegurança que meu pai sentia a respeito de minha sexualidade. Acho que tudo começou quando se separou da minha mãe. Eu era uma criança de 5 anos. Eles, outras duas de 28 e 29. Ela, sempre opiniática e adepta de uma postura rebelde, fruto de uma família prejudicada e atormentada pela precipitada morte da minha avó. Uma história verdadeiramente difícil que viria a trazer muitas consequências. Ele, um radical sensível que trocava tudo e todos por uma noitada, fruto de um lar psicologicamente adoentado e um relacionamento que virou de pai e filho apenas aos seus 18 anos para durar apenas 5 até meu avô falecer após um longo e doloroso processo de AVC.

Quando se separaram, fui morar com minha mãe, que por sua postura de afronta ao mundo, sempre foi uma pessoa "pra frentex" e sempre teve muitos amigos gays. Para desespero do meu pai, claro. A partir daí, vinha sempre o ritual perturbador do final de semana, as culpas não esclarecidas de abandonar a mãe misturada com a vontade imensa de passar o uns dias com meu pai.

Um papo era certo no final de semana: "tua mãe não fica levando veado para dentro de casa, né??"
Dizia que não, um misto de querer protegê-la com um incômodo tão grande com aquele tom desmerecedor com pessoas que eu simpatizava. "Por que tu estás dizendo 'ai'? Não tens que imitar a tua mãe." E por aí íamos. Difícil. Nem sabia o quanto direito.


Nas vésperas de fazer 10 anos, ele foi embora da cidade. Lembro até hoje da dor que senti quando fiquei sabendo que irita tomar tamanha distância de mim. Me encho de lágrimas de lembrar daquela tarde em que ele e minha mãe (já com a relação excepcional que possuem até hoje) conversavam e ela comentou "ele sabe que é importante para ti, ele entende". Queria apenas gritar, deixar-me levar aos prantos. Não queria entender! Talvez tenha sido meu primeiro momento de grande força.

Nos dias seguintes, a dor se acomodou e deu lugar a um certo alívio. Não mais seria podado por qualquer "ai" ou qualquer trejeito que me era, imediatamente, cortado por ele. Daí para a frente veio um período que, a respeito de memórias do que sentia em relação ao meu pai, não consigo lembrar. Não lembro. Foram 3 anos até ele voltar, e um período que muita coisa viria a acontecer.


Veio a adolescência. Veio a namorada. Veio a paz! Que paz ele sentiu com aquele namoro. Não demoraria muito até a duradoura relação virar incômodo também. Tinha tanta mulher no mundo... Mas, o namoro acabou. E, desde então, aguarda cenas do próximo capítulo. Hoje, com uma atitude tão amadurecida que mete medo. Quem é esse pai que tem se mostrado tão aberto e disposto a me conhecer?

Hoje, a insegurança é minha... quem sou eu?

9 comentários:

  1. Tu és um rapaz atormentado pelo passado gurbulento e pelas dúvidas que qualquer pessoa no teu lugar sentiria. O jeito é avançar devagarinho, sempre dando cada passo em frente com calma e cautela.

    Seguindo o teu blog! :)

    Um abraço :)

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    1. Kuma, obrigado pelo comentário! Confesso que me remexeu um pouco! Sinal que fez bem, fez pensar!

      Volte sempre!

      Abraço!

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  2. menino, que texto lindo. parabéns!
    mas eu te entendo bem, meu pai agia do mesmo jeito comigo, e diariamente já que ele morava comigo, e para uma criança isso é muito difícil mesmo.
    estou colocando seu link lá no blog viu?

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    1. Foxx!!
      Obrigado pelas palavras! Essa vida é uma construção, né? Tijolo por tijolo...
      Desculpa não ter pedido autorização, mas o teu já estava com o link aqui! :P

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    2. sim, nossa vida é uma construção, tijolo por tijolo.
      e não precisava ter autorização, né? :)

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  3. Chico! Seus textos são absolutamente deliciosos! São muito bem escritos! Parabéns!

    Assim como o seu pai, você também vai passar por um bom caminho até "se descobrir". Às vezes acho que ninguém se descobre por completo; nós vamos tendo doses de autocompreensão, mas nos conhecer por completo, não sei!

    Mas, de qualquer forma, isso é positivo e gostoso. Nada mais gostoso que aprendermos coisas sobre nós mesmos.

    Abração!

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  4. Vinícius!
    Obrigado! Foi um texto muito de coração. Tenho que me cuidar para não me alongar demais.
    Curioso mencionares meu pai, tenho minhas teorias sobre ele... mas acho que é assunto para um outro post!
    Concordo, acho que estamos sempre nos descobrindo, de acordo com o momento e com o que a vida nos dá de oportunidades.

    Grande abraço!!! Volte sempre!

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  5. Olá Chico!

    Eu também sou filho de pais separados e sei os problemas que o divórcio pode causar. O divórcio dos meus pais não foi muito tumultuoso, mas é inevitável que sejamos um pouco o brinquedo de ambos, usando-nos como arma de arremesso. Isso também acabou por acontecer comigo.

    Quanto às mentalidades, os meus pais são pessoas liberais e abertas. :)


    abraço e gostei do blogue.

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    1. Mark, sim, sempre é inevitável brincarem de cabo de guerra com a gente. Os meus pais demoraram pouco tempo para criarem uma relação harmoniosa entre eles. Uma vez que conseguiram isso se manteve até os dias de hoje. No entanto, quando alguns medos batem tão forte, como no caso do meu pai, vejo como uma tendência que um se foque no que considera erro do outro para justificar o que não se quer ou planejou.

      Grande abraço e obrigado pela visita!

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